sábado, 28 de julho de 2012

A Idade Média





O período medieval caracterizou-se pelo feudalismo, isto é, estrutura econômica, social, política e cultural que se edificou progressivamente na Europa centro-ocidental em substituição à estrutura escravista da Antiguidade romana.


O feudalismo começou com o processo de fixação da população européia no campo. A agricultura, praticadas nas Villae (vilas ou grandes propriedades agrárias), constituiu a base de uma economia auto-suficiente, cujos desdobramentos conduziriam à formação do mundo agro-feudal.


Os feudos eram os núcleos com base nos quais a sociedade feudal se organizou. Por volta do ano 1000, a maioria das pessoas na Europa ocidental vivia em feudos. Nesse período, a terra tornou-se o bem mais importante, por ser a principal fonte de sobrevivência e poder.


O modo de produção feudal tinha como base a economia agrária, não-comercial, auto-suficiente, quase totalmente amonetária (ou seja, com uso restrito de moedas). A propriedade feudal pertencia a uma camada privilegiada, composta pelos senhores feudais, altos dignitários da Igreja (o clero) e a nobreza.


Servo camponês trabalha com arado no campo das terras de seu senhor. Imagem de As mui ricas horas do duque de Berry, um livro de horas de 1410 com orações para cada hora canônica do dia, encomendado pelo nobre francês João de Valois, o Magnífico, Duque de Berry e Conde de Poitiers. Museu de Condé, Chantilly, França.



A principal unidade econômica era o feudo, que se dividia em três partes: a propriedade privada do senhor, chamada de domínio ou manso senhorial, no interior da qual havia geralmente um castelo fortificado; o manso servil, ou seja, a porção de terras arrendadas aos camponeses e que era divididos em lotes, chamados de tenências; e o manso comunal, terras coletivas (pastos e bosques) usados tanto pelo senhor como pelos servos.






Castelo Lichtenstein, ou Castelo do Conto de Fadas, do século XII, um dos ícones no imaginario da Idade Media, localizado em Baden-Wurttemberg, Alemanha.
Cada família de servos tinha a posse de um lote de terras (ou tenência) no feudo para trabalhar. O desenvolvimento técnico na produção economica feudal foi pequeno, limitando aumentos de produtividade. A agricultura era praticada por meio de técnicas simples. O arado de madeira, puxado por boi, era o equipamento principal. Para não esgotar o solo, usava-se um sistema de rotação trienal. Na imagem acima, podemos ver a rotatividade: enquanto uma parte da terra está em descanso, uma está sendo preparada para o plantio e outra está no processo de colheita.



A Sociedade feudal



No feudalismo, o critério de diferenciação dos grupos sociais era a posse das terras, que estava rigidamente definida: de um lado, os senhores, cuja riqueza provinha da posse territorial e da exploração do trabalho servil; de outro, os servos, vinculados à terra e sem possibilidades de ascender socialmente. A esse tipo de sociedade, estratificada, sem mobilidade social, dá-se o nome de sociedade estamental.


A sociedade feudal era composta por três estamentos, três grupos sociais com status fixo: o clero (os oratores), a nobreza (os bellatores, isto é, que lutam) e os camponeses (os laboratores, que trabalham):

  • O clero tinha como função oficial rezar. Na prática, exercia grande poder político sobre uma sociedade bastante religiosa, onde o conceito de separação entre a religião e a política era desconhecido. Mantinham a ordem da sociedade evitando, por meio de persuasão e criação de justificativas religiosas, revoltas e contratações camponesas.

  • A nobreza (também chamados de senhores feudais) principal função guerrear, além de exercer considerável poder político sobre as demais classes. O Rei lhes cedia terras e estes lhe juravam ajuda militar (relações de suserania e vassalagem).

  • Os servos da gleba constituíam a maior parte da população camponesa, presos à terra e explorados em sua força de trabalho. Para receberem direito à moradia nas terras de seus senhores, assim como entre nobres e reis, juravam-lhe fidelidade e trabalho.


Destes estamentos sociais, dois grupos eram principais na sociedade feudal: os senhores feudais e os servos. Os servos eram constituídos pela maior parte da população camponesa, presos ao feudo e sofrendo grande exploração pelo senhor. Eram obrigados a pagar diversos tributos e prestar vários serviços ao senhor em troca da permissão do uso da terra e de proteção militar. As principais obrigações dos servos consistiam em:


  • Corvéia: trabalho compulsório nas terras do senhor em alguns dias da semana;

  • Talha: parte da produção do servo entregue ao nobre;

  • Banalidade: tributo cobrado pelo uso dos bens do feudo, como o moinho, o forno, o celeiro;

  • Capitação: imposto pago por cada membro da família (por cabeça);

  • Tostão de Pedro ou dízimo: 10% da produção do servo era pago à Igreja, para a manutenção da capela local;

  • Censo: tributo que os vilões (pessoas livres, vila) deviam pagar, em dinheiro, para a nobreza;

  • Formariage: quando o nobre resolvia se casar , todo servo era obrigado a pagar uma taxa para ajudar no casamento, era também válida para quando um parente do nobre iria casar;

  • Mão Morta: Era o pagamento de uma taxa para permanecer no feudo da família servil, em caso do falecimento do pai da família;
  • Albermagem: Obrigaçao do servo em hospedar o senhor feudal.



Diferentemente dos escravos, os servos estavam presos à terra e dali não podiam sair. Mesmo que um feudo mudasse de senhor, não poderiam ser expulsos dele, passando a prestar obrigações ao novo senhor.


Ainda que entregasse grande parte da colheita ao senhor, o servo produzia sua própria economia. Entretanto, os servos ficavam à mercê de circunstâncias quase tão cruéis quanto as enfrentadas pelos escravos na antiguidade greco-romana.


Além do clero, da nobreza e dos servos, havia ainda os vilões, prováveis antigos proprietários livres, embora ligados a um senhor, eram servos com mais liberdade.


A mobilidade social praticamente inexistia. Rígidas tradições e vínculos jurídicos determinavam a posição social de cada indivíduo desde o nascimento.


Neste contexto, em muitas regiões da Europa feudal eclodiram revoltas de servos, sobretudo, contra a situação de exploração política e social que estes sofriam. Uma das revoltas de servos mais importantes foi a Jacquerie.


A Jacquerie foi uma revolta camponesa que ocorreu no Norte de França entre 28 de Maio e 24 de Junho de 1358, durante a Guerra dos Cem Anos. A designação deriva de Jacques Bonhomme, que designava genericamente um camponês e que posteriormente foi usada pejorativamente, equivalendo a “joão-ninguém”.


A revolta iniciou-se de forma espontânea, reflectindo a sensação de desespero em que viviam as camadas mais pobres da sociedade, depois da Peste Negra, numa altura em que a França se encontrava num vazio de poder. Ressentidos contra a falta de proteção, os camponeses revoltaram-se contra a classe dominante. As elites acabaram por esmagar a revolta em menos de um mês, matando, no processo, cerca de 20.000 homens.


Houve também a Guerra dos Camponeses (em alemão, Deutscher Bauernkrieg) de 1524 a 1526 na Alemanha que consistiu em um conjunto de revoltas com causas económicas bem como religiosas por camponeses. Essa revolta camponesa alemã foi comandada por Thomas Münzer, que infuenciado pelas teorias protestantes, tentou confiscar terras senhoriais e da Igreja Católica. O conflito envolveu no seu auge, em 1525, cerca de 300.000 camponeses revoltados. Estimativas situaram o número de mortes em 100.000.




Suserania, vassalagem e a Cavalaria feudal


Na sociedade feudal, os senhores feudais ligavam-se entre si por meio de um complexo sistema de obrigações e tradições. A base social dos reinos feudais se constituiria a partir da combinação de tradições, costumes, crenças e estruturas sociais herdadas dos romanos e dos povos germânicos, tais como: a clientela, relação de dependência existente na Roma antiga, a partir da qual um cliente ligava-se a um senhor em busca de proteção, em troca, tendo obrigações para com o senhor; o colonato, de origem romana, era a obrigatoriedade de permanência do colono nas propriedades rurais; o comitatus, da tradição germânica na qual o guerreiro devia absoluta lealdade ao chefe tribal, contribuindo para a formação das relações de suserania e vassalagem.


Como a terra tinha grande importância na época feudal, era comum entre a nobreza a retribuição de serviços prestados com a concessão de terras. Os nobres que as cediam eram os suseranos e aqueles que as recebiam tornavam-se seus vassalos. Havia um cerimonial, a homenagem, que acompanhava a concessão do feudo (o beneficium), ocasião em que o vassalo jurava fidelidade ao suserano, momento denominado de investidura. O vassalo comprometia-se à acompanhar o suserano nas guerras, assim como o suserano jurava, em reciprocidade, proteção ao vassalo.


Os vassalos tinham, assim, obrigações para com seus suseranos como, por exemplo, o Consilium (o conselho), que consistia em geral na obrigação de participar das assembléias reunidas pelo senhor, e em particular, na obrigação de aplicar a justiça em seu nome, e o Auxilium, a ajuda, em geral militar e eventualmente financeira. O vassalo devia, pois contribuir para a administração, a justiça e o exército senhoriais. Em contrapartida, o senhor devia-lhe proteção. Essa relação de obrigação recíproca entre suseranos e vassalos fez da dependência a caracteristica principal das relações sociais feudais.

Após a desintegração do Império Romano do Ocidente, a Europa foi ocupada por vários reinos, cuja principal característica era a descentralização do poder, dividido entre o rei e os senhores do feudo. O rei cumpria, sobretudo, funções simbólicas. Era considerado o principal suserano. Também subordinado às obrigações do sistema de suserania e vassalagem, dependia do exército formado por seu vassalos e dos tributos recolhidos em seus próprios domínios feudais.

A estrutura do feudalismo se fez em meio a guerras continuas, decorrentes das invasões bárbaras e das constantes disputas por poder. Foi nesse contexto que se formou a cavalaria medieval, cujo ideal de honra. Lealdade e heroismo transformava o cavaleiro em um mito heróico da época.



Cavalaria normanda na Tapeçaria de Bayeux, século XII, Inglaterra, feita para comemorar a batalha de Hastings, 1066.


A Cavalaria medieval era composta por cavaleiros nobres. Os cavaleiros se tornaram a classe dominante, controlando a terra da qual provinha toda a riqueza. Os cavaleiros eram nobres originalmente por causa de seu status e prestígio como guerreiros supremos num mundo violento.

As principais regras do código de cavalaria eram as seguintes: proteger as mulheres e os fracos; defender a justiça contra a injustiça e o mal; defender sua terra natal; defender a Igreja.

Armaduras medievais: os bens necessários para se tornar cavaleiro. Museu de Arte Metropolitano, Nova Iorque, EUA.


Na idade de 7 anos, garotos da nobreza eram mandados para viverem com grandes lordes como pagens, aprendendo o treinamento no uso de armas e a cavalgar. Aos 14 anos, o jovem se tornava escudeiro, um cavaleiro em treinamento. Com 21 anos, o escudeiro era elegível para se tornar um cavaleiro.


A cavalaria medieval estava diretamente ligada à guerra. Tornar-se cavaleiro significava pertencer a uma condição social privilegiada, que estava separada da maioria da população desarmada, a quem a Ordem da Cavalaria era impedida. A cavalaria era exercida exclusivamente pela nobreza feudal. Para ser cavaleiro era preciso ter posses, sobretudo para se poder adquirir os bens necessários para se tornar cavaleiro: o cavalo, a armadura, a espada e a lança.



Texto e Contexto

Amadis de Gaula é a obra mais marcante da cultura cavaleiresca medieval ibérica. Amadis de Gaula, chamado de Donzel do Mar, aos quinze anos na Escócia reivindicou ao Rei Lisuarte, da Inglaterra, o titulo de cavaleiro:

– Senhor, se vos prouguesse, tempo seria de ser eu cavaleiro.
O Rei disse:
– Como, Donzel do Mar! Já vos esforçais para manter cavalaria? Sabei que é cousa ligeira de haver e grave de manter. E quem este nome de cavalaria quiser ganhar e mantê-lo com honra, tantas e tão graves são as cousas que tem de fazer que muitas vezes o seu coração se fatiga (...).
O Donzel do Mar disse-lhe:
– Nem por tudo isso deixarei de ser cavaleiro, que se no meu pensamento não tivesse de cumprir isso que haveis dito, não esforçaria o meu coração para o ser. E, pois, à vossa mercê sou criado, cumpri nisto o que me deveis; senão buscarei outro que o faça.

(...)

Oriana [filha do rei] veio ante o Rei (...) e disse ela:
– Eu vos quero pedir um dom.
– De grado – disse o Rei – o farei.
– Pois fazei-me este meu donzel cavaleiro.
E mostrou-lho, que de joelhos ante o altar estava. O Rei viu o Donzel (...) e chegando-se a ele disse:
– Quereis receber ordem de cavalaria?
– Quero – disse ele.
– Em nome de Deus; e que Ele mande que tão bem empregada em vós seja.
E pondo-lhe a espora direita disse:
– Agora sois cavaleiro e podeis tomar a espada.

(João de Barros. Amadis de Gaula. Capítulo IV. 1508.)






A Igreja Católica e a Cultura Teocêntrica Cristã medieval



A Igreja Católica tornou-se a maior instituição do Ocidente europeu. Sua incalculável riqueza e a sólida organização permitiram ao cristianismo exercer a hegemonia ideológica e cultural da época medieval.


O cristianismo tem suas raízes na antiguidade Palestina, originando-se de outra religião, o judaísmo, religião monoteísta do povo Hebreu ou Israelita. A religião cristã se fortaleceu na Europa, sobretudo, a partir do século IV, através do Edito de Tessalônica (391 d.C.) que tornou o Cristianismo a religião oficial do então Império Romano.


Texto e Contexto

Velho Testamento

“Então falou Deus todas estas palavras, dizendo: (...) Não terás outros deuses diante de mim”.
(Moisés em Os dez mandamentos, Êxodo, 20, 2, 3.)


Novo Testamento

“Há um só corpo e um só Espírito, como também fostes chamados em uma só esperança da vossa vocação;
Um só senhor, uma só fé, um só batismo;
Um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos.” (Epístola de S. Paulo Apóstolo aos Efésios 4, 5, 6.)



A história do Cristianismo se inicia a partir das pregações de Jesus, um carpinteiro nascido na Galiléia, que se autoproclamava o “messias”, ou seja, o “escolhido”.

Jesus nasceu em Nazaré, mas o Cristianismo nasceu mesmo em Jerusalém, uma cidade na periferia do vasto Império Romano, onde um grupo de pescadores e agricultores apareceu falando de Jesus que morrera crucificado e ressuscitara. Por volta do ano 40 d.C., o grupo já pregava ser Jesus o messias.


O Cristianismo, que se difundiria séculos mais tarde na Europa medieval, possuía características distintas, como, por exemplo, o Monoteísmo, isto é, a crença em um único Deus.


Atuando em todos os níveis da vida social, a Igreja impôs ao homem medieval os valores teológicos, isto é, a cultura religiosa cristã, que desencadeou o teocentrismo.


Teocentrismo (do grego θεóς, theos, “Deus”; e κέντρον, kentron, “centro”) é a concepção segundo a qual Deus é o centro do universo, tudo foi criado por ele e por ele é dirigido.
No início da Idade Méda, a Igreja teve como função principal a conversão dos bárbaros, a sua integração com os romanos e o controle espiritual da população. Contudo, o clero acabou por se envolver com questões seculares, isto é, políticas, sociais e administrativas, realizadas pelo Papa, arcebispos, bispos e Padres, ou seja, pelo clero secular (do latim saeculum, que significa “mundo”, ligado as coisas terrenas).


Como reação a essa tendência nasceu o clero regular (do latim regula, que significa “regras”), constituído por monges e abades recolhidos em mosteiros, sob voto de castidade, caridade e pobreza.
O escriturário e copista Jean Miélot, secretário do Duque Philip de Borgonha, século XV.

Além da conversão dos camponeses pagãos, os monastérios eram os centros mais avançados da vida cultural da Idade Média. Os monges tinham uma intensa atividade intelectual, principalmente com a conservação e recuperação das obras da antiga cultura greco-romana, monopolizando seu conhecimento e restringindo sua difusão, e organizando e mantendo escolas e bibliotecas.

A arte medieval era também dominada pelos preceitos da religião. A arte cristã tinha o objetivo de iniciar os fiéis nas histórias da Igreja e nas passagens biblicas. Na pintura, na escultura e nos vitrais das Igrejas, os temas representados eram: Deus, os anjos, os santos e, de modo geral, as cenas que ensinassem os fiéis a respeito da doutrina cristã.


Maria e Filho (Jesus), de Berlinghiero, inicio do sec XII.


Havia, por exemplo, os Ícones, painéis de madeira com personagens cristãos, sempre com olhar fixo e halo (círculo ao redor da cabeça).

Na arquitetura imperava a mesma concepção. As maiores construções medievais foram as igrejas. A partir do século XI, desenvolveu-se um estilo arquitetônico propriamente medieval, chamado românico. Os edifícios eram relativamente simples, embora de grandes proporções. Seus elementos característicos eram a coluna e o arco romano.

A partir do século XII, surgiu na França um novo estilo, batizado com o nome de gótico, com uma nova técnica de construção, o arco ogival. Eram enormes catedrais, simbolos da riqueza das novas cidades.

Igreja em estilo românico de São Pedro de Rates, Portugal, século IX.

Catedral gótica de Chartres, França, século XII.

Jesus Cristo na ultima Ceia, vitral gótico da Catedral de Chartres, França.


No campo religioso-espiritual durante a Idade Média, era constante o confronto de dois sistemas teológicos: a teologia agostiniana e o tomismo. Teologia, no sentido literal, é o estudo sobre Deus (do grego θεóς, theos, “Deus”; + λóγος, logos, “conhecimento” ou “estudo”).


Texto e Contexto

“O homem, pois, embora já espiritual e renovado pelo conhecimento, conforme a imagem de seu criador, deve ser cumpridor da lei, e não seu juiz. Nem pode ajuizar sobre o que distingue espirituais e carnais. Somente teus olhos, meu Senhor, os distinguem, mesmo que nenhuma obra sua os tenha revelado a nós, para que os reconheçamos por seus frutos. Mas tu, Senhor, já os conheces e os classificaste, e os chamaste no segredo de teu pensamento, antes de ter criado o firmamento.”
(Santo Agostinho. Confissões. Livro Décimo-Terceiro, Capítulo XXIII.)
Aurélio Agostinho (do latim, Aurelius Augustinus), Agostinho de Hipona, São Agostinho ou Santo Agostinho foi um bispo católico, teólogo e filósofo, considerado pelos católicos santo e Doutor da Igreja.


O pensamento de Agostinho foi também basilar na orientação da visão do homem medieval. Uma de suas teorias centrais é a predestinação. Segundo esta, o Deus onipotente escolhe, de acordo com seus desígnos, aqueles que iriam para o paraíso e os que trilhariam o caminho da perdição, destinados ao inferno. Para Agostinho, a fé era o único sinal que evidenciava que alguém pertencia ao grupo dos escolhidos.


O Tomismo é a doutrina ou filosofia escolástica de São Tomás de Aquino (1225-1274), adotada pela Igreja Católica, caracterizando-se pela tentativa de conciliar o aristotelismo com o cristianismo.


A nova concepção tomista era a do livre-arbítrio. Considerava que o homem poderia colaborar com Deus no empenho de conseguir a salvação, cabendo-lhe escolher o bem, fazer boas obras, afastando-se do mal.




Texto e Contexto
“Deus quis que, entre os homens, uns fossem senhores e outros servos, de tal maneira que os senhores estejam obrigados a venerar e amar a Deus, e que os servos estejam obrigados a amar e venerar o seu senhor.”
(Do religioso medieval St. Laud de Angers. In: FREITAS, Gustavo de. 900 textos e documentos de história. Lisboa: Plátano, 1975.)




A Escolástica é o ensino teológico-filosófico da doutrina aristotélico-tomista ministrado nas escolas de conventos e catedrais e nas universidades européias medievais. Como sistema filosófico e teológico, a escolástica tentou resolver problemas como a relação entre fé e razão, desejo e pensamento.


O clero transmitia à população européia medieval uma visão de mundo que lhe era conveniente e adequada ao período. Com domínio das consciências, a Igreja moldou hábitos, valores, normas e costumes, combatendo o que considerava “desvios” de crença e de comportamento, justificando os privilégios estabelecidos pelos grupos dominantes da sociedade feudal (nobreza e clero).


Entre os instrumentos de controle da Igreja em relação à espiritualidade e a fé de seus fiéis, havia o Tribunal do Santo Ofício, a vigilância aterrorizante da Inquisição.


Inquisição (do latim Inquisitio Haereticæ Pravitatis Sanctum Officium) deriva do ato judicial de inquirir, que significa perguntar, averiguar, interrogar. A Inquisição foi uma operação oficial conduzida pela Igreja Católica a fim de apurar e punir pessoas por heresia. Heresia vem do grego haíresis e significa escolha. É heresia a escolha contrária ou diferente de um credo ou sistema religioso.


Dentre as heresias que mais preocupavam a Igreja católica na Idade Média destacam-se os Valdenses, religiosos seguidores de Pedro Valdo que negavam a supremacia de Roma e rejeitavam o culto às imagens como idolatria, e os Cátaros (do grego καϑαρός “katharós”, “puro”) foi uma seita cristã da Idade Média surgida no Languedoc, região no sudoeste da França ao final do século XI. Para os cátaros o livro sagrado era a Bíblia, em particular o Novo Testamento, mas segundo sua crença, Jesus não era filho de Deus, mas apenas um profeta importante, eles não admitiam distinção entre sexos, permitindo inclusive que mulheres celebrassem ritos religiosos e muito menos reconheciam a autoridade Papal ou dos bispos.


Os crimes julgados pela Inquisição eram de duas naturezas: contra a fé (a heresia, blasfêmia, ateísmo, dasacato, etc.) e contra a moral e os costumes (bigamia, feitiçaria, sodomia).


A Inquisição acontecia a partir de denúncias, delações ou “rumores”. Todo réu para salvar-se, tinha de confessar-se culpado. A pena de morte pela fogueira recebiam os réus que recusavam confessar-se culpados e também os “relapsos”, isto é, aqueles que já condenados uma vez, voltaram a pecar. A morte na fogueira, também conhecida como autos-de-fé, tornaram-se enormes festas populares realizadas uma vez por ano.



A pena máxima da Inquisição, o Auto-de-fé. Execução do monge Savanarola, Itália, em 1498.Só em Portugal a Inquisição processou mais de quarenta mil pessoas e queimou mais de 1800 nas fogueiras. Na Espanha foram penitenciadas mais de 340 mil pessoas.



O Islamismo

Durante a Idade Média, surgiu na península Arábica outra religião monoteísta, cujo personagem principal foi o árabe Maomé que, em 610 d.C., após longos anos de meditação, dizendo-se profeta, revelou ao mundo árabe o Islamismo, religião que condenava o politeísmo e apresentava um sincretismo dos credos cristãos e judaícos, considerando Alá o único Deus.


O Islamismo ou Islã (que significa “submissão a Alá”) tem por base o Alcorão, livro sagrado dos mulçumanos ou maometanos, uma espécie de código de moral e justiça, definindo também normas de comportamento. Entre suas determinações está a crença em um único deus, Alá, orar cinco vezes ao dia voltado para Meca (centro religioso islâmico), a peregrinação à Caaba, santuário islâmico em Meca, uma vez na vida e guardar as sextas-feiras.




O Profeta orando na Caaba, numa gravura otomana do séc. XVI. Seu rosto está vendado, algo comum na arte islâmica da época.



Caaba, santuário islâmico em Meca.

Maomé morreu em 632, deixando os árabes unidos no ideal comum de realizar a djihad (“guerra santa”), que consistia na luta pela conversão dos “infiéis” (os não-islâmicos) e que, nas décadas seguintes, propiciaria a expansão islâmica.


A expansão dos árabes, também chamados de sarracenos, motivada pelo crescimento populacional e escassez de terras férteis e legitimada ideologicamente pela djihad, iniciou-se com a conquista de territórios dos persas e da região da Palestina.




As Cruzadas

O movimento cruzadista é geralmente definido como uma série de expedições armadas realizadas pelos cristãos contra os muçulmanos, com o propósito de romper o cerco a que a Europa fora submetida desde o século VIII e com o objetivo de colocar a Terra Santa (nome pelo qual os cristãos denominavam a Palestina) e a cidade de Jerusalém sob a soberania dos cristãos.


A ocorrência das Cruzadas expressava a própria cultura e a mentalidade de uma época. Tendo como base a intensa religiosidade presente na sociedade feudal, a Igreja sempre defendia a participação dos fiéis na Guerra Santa, prometendo a eles recompensas divinas, como a salvação da alma e a vida eterna, em pregações realizadas em toda a Europa.


Cruzados ou Cavaleiros de Cristo. Pintura de Jan van Eyck, 1432.
Outros fatores foram igualmente importantes para a instituição das Cruzadas, como a marginalização de grande parte da população européia decorrente do crescimento populacional e a persistência do direito de primogenitura, isto é, o direito do filho primogênito de um senhor herdar todos seus bens e deixar nada para os outros filhos, aos quais só restava servir ao seu irmão mais velho, formando uma camada de “nobres despossuídos” interessada em conquistar territórios no Oriente por meio das Cruzadas.
  • a Cruzada Popular ou dos Mendigos (1096) foi extra-oficial, comandada pelo monge Pedro, o Eremita;
  • a Cruzada dos Nobres ou dos Cavaleiros foi a primeira cruzada oficial, reconquistou Jerusalém em 1099;
  • em 1145 há uma segunda Cruzada pregada por São Bernardo e liderada por Luís VII rei da França;
  • a Terceira Cruzada, pregada pelo Papa Gregório VIII após a tomada de Jerusalém pelo sultão Saladino em 1187, foi denominada Cruzada dos Reis, tendo a participação dos três principais reis europeus da época: Filipe Augusto (França), Frederico Barbaruiva (Sacro Império Romano-Germânico) e Ricardo Coração de Leão (Inglaterra);
  • a quarta Cruzada foi denominada também de Cruzada Comercial, por ter sido desviada de seu intuito original pelo doge (duque) Dândolo, de Veneza, que levou os cristãos a saquear Zara e Constantinopla;
  • a quinta Cruzada partiu em 1217 e foi liderada por André II, rei da Hungria, e por Leopoldo VI, duque da Áustria, e tinha como objetivo conquistar o Egito;
  • a sexta Cruzada foi liderada por Frederico II do Sacro Império, resultando apenas em acordos com os turcos;
  • a setima Cruzada foi liderada pelo rei da França Luís IX contra o Egito e não obteve nenhum sucesso;
  • a Cruzada das Crianças, com origem na França e na Alemanha, em 1212, que teria ocorrido entre a Terceira e a Quarta Cruzada e seria extra-oficial, baseado na crença que apenas as almas puras (no caso as crianças) poderiam libertar Jerusalém. Foi um desastre, pois a maioria das crianças morreu de fome ou de frio.



O Cisma do Oriente



No Oriente europeu, o Cristianismo mesclou-se com valores culturais locais, adquirindo caracteristicas próprias, diferentes das do Cristianismo ocidental.


As divergências entre o Cristianismo do Ocidente, orientado pelo Papa, e o Cristianismo do Oriente, cujo principal personagem era o patriarca de Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente, culminaram no rompimento da Igreja oriental com a Igreja ocidental.


Em 1054, o patriarca de Constantinopla, Miguel Cerulário, fora excomungado pelo papa e, diante disto, proclamou a autonomia total da Igreja oriental. Este acontecimento ficou conhecido como o Cisma do Oriente.


Com a cisão, suriram duas Igrejas cristãs: a Igreja Católica Apostólica Romana, com sede em Roma e dirigida pelo Papa, e a Igreja Ortodoxa, subordinada ao patriarca de Constantinopla.




Texto Complementar


Guerreiros e Camponeses


“A exploração senhorial obedecia a um padrão sociológico que provavelmente se ajustava à realidade das relações econômicas e que, ao mesmo tempo, lhes dava uma maior solidez. À medida que se afastava o ano 1000, os conflitos de paz começaram a invocar a teoria das três ordens (...) Deus tinha distribuido tarefas específicas a cada homem: uns deviam orar pela salvação de todos, outros deviam lutar para proteger o povo; cabia aos membros do terceiro estado, de longe o mais numeroso. Alimentar, com o seu trabalho, os homens de religião e da guerra. Este padrão, que rapidamente marcou a consciencia coletiva, apresentava uma forma simples e em conformidade com o plano divino e assim sancionava a desigualdade social e todas as formas de exploração econômica.”
(DUBY, Georges. Guerreiros e Camponeses. Lisboa: Estampa, 1980. pp. 180-181.)


Suserania e Vassalagem

“(...) o monarca era suserano feudal dos seus vassalos, aos quais estava ligado por laços recíprocros de fidelidade, não um soberano supremo colocado acima dos seus súditos. Os seus recursos econômicos provinham quase exclusivamente de seus domínios pessoais enquanto senhor, enquanto que aos seus vassalos pedia contribuições de natureza essencialmente militar. Não tinha acesso político direto ao conjunto da população, pois a jurisdição sobre ela era exercida por intermédio de inúmeras sub-instâncias feudais. Com efeito, só mandava nos seus próprios domínios, fora deles era em grande medida apenas uma efígie cerimonial.”
(ANDERSON, Perry. Passagens da Antiguidade ao feudalismo. Porto: Afrontamento, 1980. pp. 167-168.)


O Camponês


“O camponês vivia numa choça do tipo mais miserável. Trabalhando longa e arduamente em suas faixas de terra espalhadas, conseguia arrancar do solo apenas o suficiente para uma vida miserável. Teria vivido melhor, não fora o fato de que, dois ou três dias por semana, tinha que trabalhar a terra do senhor, sem pagamento. Tampouco este era o único trabalho a que estava obrigado. (...) A propriedade do senhor tinha que ser arada primeiro, semeada primeiro e ceifada primeiro.”
(HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. p. 14.)

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