Arqueólogos procuram pelo 'navio da orgia' de Calígula
Embarcação monstruosa pode estar num pequeno lago da Itália
Thiago Lincolins
Visão moderna sobre o navio e seu dono | Crédito: Wikimedia Commons/Reprodução
Autoridades italianas estão atrás de um espetacular
barco de mais de 120 metros de comprimento e quase 2 mil anos, criado
por um capricho de um dos mais odiados governantes de Roma.
Reinando
entre 37 e 41, Caio Júlio César Augusto Germânico,
mais conhecido como Calígula ("botinha"), foi o terceiro imperador. E o
segundo a ser assassinado - ascendeu ao trono após matar seu antecessor,
seu tio-avô Tibério, enquanto esse se tentava se recuperar de uma
doença. Um completo lunático. Foi acusado de
cometer incesto com cada uma das suas três irmãs, torná-las prostitutas,
forçar as mulheres de seus oficiais a deitar-se com ele, matar
prisioneiros ao final de orgias e transformar seu cavalo em senador.
Talvez
não seja assim, ou ao menos nem tudo assim: a história foi escrita por
seus inimigos. Mas ao menos uma dessas extravagâncias foi certamente
real: ele mandou construir barcos ridiculamente luxuosos. Neles,
satisfaria seus apetites exóticos. Para
evitar mais escândalos, os "iates" circulavam no Lago Nêmi, que fica há
cerca de 30 quilômetros de Roma. Postos num laguinho de pouco mais de um
quilômetro quadrado, tinham mais de 70 metros - o tamanho dos maiores
navios que cruzavam oceanos na época das Grandes Navegações.
+ Leia mais sobre como Calígula possivelmente não era esse monstro todo
Sabemos
que eles são reais porque foram achados: foram avistados da superfície
já no século 15. Muito depois, em 1931, o ditador Benito Mussolini
ordenou que fosse feita uma drenagem do lago. Dois barcos foram
recuperados e expostos num museu feito só para eles em Roma. Mas o
incrível achado não durou muito tempo. Durante a Segunda Guerra, o
museu foi atingido pela artilharia dos EUA. Num desastre para a
arqueologia, os navios acabaram incinerados.
Mussolini,
porém, pode ter feito o favor à História de deixar o mais
impressionante submerso. O projeto de drenagem de 1931 teve de ser
parado às pressas porque a terra em torno do lago se tornou instável,
causando desabamentos.
O que nos traz de volta ao presente. Para resolver o mistério de uma vez, as
autoridades da Itália montaram uma grande busca no lago, envolvendo pesquisadores da Agência de Proteção ambiental da Calábria, mergulhadores
e autoridades portuárias de Fiumicino. ''Pode parecer bizarro
o fato de um grande barco ter naufragado em um pequeno lago como esse, mas o
fato de ter pertencido a Calígula faz essa cena ser provável'', diz Luigi
Dattola, da Agência de Proteção Ambiental da Calábria, em entrevista ao Seeker.
O que ele quer dizer com "pertencido a Calígula" é pelo fim que os barcos levaram. Numa tentativa de damnatio memoriae (remover as lembranças de alguém da História), foram afundados propositalmente após o assassinato de seu dono. Para facilitar a busca, o time de Dattola conta com a ajuda
de equipamentos que conseguem detectar objetos que estejam enterrados abaixo do
fundo do lago. Apesar de ter encontrado
algumas anomalias que não são relacionadas ao barco, a busca ainda está num estágio preliminar. ''Caso o barco seja encontrado o mundo terá
novas informações sobre as técnicas de construções navais dos Romanos'', diz Alberto
Bertucci, prefeito local.
Não
é brincadeira, aliás: relatos falam desse terceiro barco tendo
ridículos 120 metros de comprimento. O mundo só veria novamente
embarcações tão grandes assim na metade do século 19*. É cruzar os dedos
para o que pode ser um dos mais impressionantes achados deste século.
*Os
navios do almirante chinês Zheng He, feitos no século 15, supostamente
teriam mais de 130 metros. Mas isso é considerado improvável por boa
parte dos historiadores atuais, que colocam suas medidas por volta dos
60 metros.