sábado, 8 de setembro de 2012

O BRASIL, POR GILBERTO FREYRE


Gilberto Freyre

Bom é conhecer nossa história no palavreado irreverente de Gilberto Freyre. e saber um pouco do que se passou entre a Casa Grande & Senzala que influenciou a formação sócio-cultural do povo brasileiro.São fatos relevantes traduzidos numa linguagem sem reservas, em que o autor nos apresenta uma miscigenação de costumes, crenças, saberes e tradições do indígena brasileiro, do negro africano e do branco português que estruturou todo um modo de vida tipicamente brasileiro. (*1)
São relatos interessantes do que aconteceu nos trópicos brasileiros na era colonial vejamos alguns:
                                                                         
             




>> Caderno recolhedores de fato

Também houve_ isto no século XVII E XIX_ esquisitões pepys de meia tigela, que tiveram a pachorra de colecionar em cadernos gossip e mexericos: chamavam-se "recolhedores de fatos", antecipando-se aos pasquins, colecionavam casos vergonhosos, que em momento oportuno, serviam para emporcalhar brasões ou nomes respeitáveis. Em geral, exploravam-se os preconceitos de branquidade e de sangue nobre; desencavava-se alguma remota avô escrava ou mina: ou tio que cumpria sentença: avô que aqui chegara de sambenito. Registravam-se irregularidades sexuais e morais de antepassados. Até mesmo de senhoras.

>> A lenda de moura- encantada e a lenda de moura-torta

O longo contato com os sarracenos deixara idealizadas entre os portugueses a figura da moura-encantada, tipo delicioso de mulher morena e de olhos pretos, envolta em misticismo sexual _ sempre de encarnado, sempre penteando os cabelos ou banhando-se nos rios ou nas águas das fontes mal assombradas_ que os colonizadores vieram encontrar parecido, quase igual, entre índias nuas e de cabelos soltos do Brasil. Que estas tinham também os olhos e os cabelos pretos, o corpo pardo pintado de vermelho e, tanto quanto as nereidas mouriscadas, eram doidas por um banho de rio onde se refrescasse sua ardente nudez e por um pente para pentear o cabelo.
Em oposição à lenda da moura encantada, mas sem alcançar nunca o mesmo prestígio, desenvolveu-se a da moura-torta. Nessa, vazou-se porventura o ciúme ou a inveja sexual da mulher loura contra a de cor. Ou repercutiu o ódio religioso: o dos cristãos louros descidos do norte contra os infiéis de pele escura.... pode-se, entretanto afirmar que a mulher morena tem sido a preferida dos portugueses para o amor, pelo menos para o amor físico. A moda da mulher loura, limitada aliás ás classes altas, terá sido antes repercussão de influências exteriores do que a expressão do genuíno gosto nacional. Com relação ao Brasil, que o diga o ditado; "Branca para casar, mulata para f..., negra para trabalhar". (*2)

>> O São Benedito

Mas a casa- grande patriarcal não foi apenas fortaleza, capela, escola, oficina, santa casa, harém, convento de moças, hospedaria. Desempenhou outra função importante na economia brasileira: foi também banco. Dentro de suas grossas paredes, debaixo dos tijolos ou mosaicos, no chão, enterrava-se dinheiro, guardava-se jóias nas capelas, enfeitando os santos. Dai nossas senhoras sobrecarregadas á baiana de teteias, balanganãs, corações, cavalinhos, cachorrinhos e correntes de ouro. Os ladrões, naqueles tempos piedosos, raramente ousavam entrar nas capelas e roubar os santos. É verdade que um roubou o esplendor e outras jóias de São Benedito; mas sob o pretexto, ponderável para a época, que "negro não devia ter luxo". com efeito chegou a proibir-se, nos tempos coloniais, o uso de "ornatos de algum  luxo" pelos negros.

>> A culinária

No regime alimentar brasileiro, a contribuição africana afirmou-se principalmente pela introdução do azeite de dendê e da pimenta malagueta, tão característicos da cozinha baiana:pela introdução do quiabo. pelo maior uso da banana, pela grande variedade de maneira de preparar a galinha e o peixe. Várias comidas portuguesas foram no Brasil modificadas pela condimentação ou pela técnica culinária do negro, alguns dos pratos mais caracteristicamente brasileiros são de técnica africana: a farofa, o quibebe, o vatapá. (*3)



A literatura de Freyre mais parece um prosear descontraído, uma conversa informal que se passa num recanto do Brasil: um relembrar de acontecimentos ditos com espontaneidade e sem formalidades. É o jeito Freyre de escrever pra gente entender e se deliciar com as palavras, ora de um escritor que, quando menino, teve dificuldade de aprender a escrever!



"Eu venho procurando redescobrir o Brasil. Eu sou rival de Pedro alvares Cabral, a caminho das Índias, desviou-se dessa rota, parece já baseado em estudos portugueses, é identificou uma terra que ficou sendo conhecida como Brasil. Mas essa terra não foi imediatamente auto conhecida. Vinham sendo acumulados estudos sobre ela... Mas faltava um estudo convergente, que além de ser histórico, geográfico, geológico, fosse... um estudo social, psicológico, uma interpretação. Creio que a primeira grande tentativa nesse sentido representou um serviço de minha parte ao Brasil"

Gilberto Freyre

Também ele sonhou e proclamou na sua poesia. um Brasil igualitário, democrático, cheio de oportunidades para todos os brasileiros:

O outro Brasil que vem ai

Eu ouço as vozes
eu veio as cores
eu sinto os passos
de outro Brasil que vem aí
mais tropical
mais fraternal
mais brasileiro.
O mapa desse Brasil em vez das cores dos Estados
terá as cores das produções e dos trabalhos.
Os homens desse Brasil em vez das cores das três raças
terão as cores das profissões e regiões.
As mulheres do Brasil em vez das cores boreais
terão as cores variamente tropicais
todo brasileiro poderá dizer: é assim que eu quero o Brasil.
todo brasileiro e não apenas o bacharel ou o doutor
o preto, o pardo, o roxo e não apenas o branco e o semibranco.
qualquer brasileiro poderá governar esse Brasil
lenhador
lavrador
pescador
vaqueiro
marinheiro
funileiro
carpinteiro
contanto que seria diano do governo do Brasil
que tenha olhos para ver pelo Brasil,
ouvidos para ouvir pelo Brasil
coragem de morrer pelo Brasil
ânimo de viver pelo Brasil
mãos para agir pelo Brasil
mãos de escultor que saibam lidar com o barro forte e novo dos Brasis
mãos de engenheiro que lidem com ingresias e tratores europeus e norte- americanos a serviço do Brasil
mãos sem anéis ( que os anéis não deixam o homem criar nem trabalhar).
mãos livres
mãos criadoras
mãos fraternais de todas as cores
mãos fraternais que trabalham por um Brasil sem Azeredos,
sem Erineus
sem Mauricios de Lacerda.
sem mãos de jogadores
nem de especuladores nem de mistificadores,
mãos todas de trabalhadores
pretas, brancas, pardas, roxas, morenas,
de artistas
de escritores
de operários
de lavradores
de pastores
de mães criando filhos
de país ensinando meninos
de padres benzendo afilhados
de mestres guiando aprendizes
de irmãos ajudando irmãos mais moços
de lavadeiras lavando
de pedreiros edificando
de doutores curando
de cozinheiras cozinhando
de vaqueiros tirando leite de vacas chamadas comadres dos homens.
mãos brasileiras
brancas, morenas, pretas, pardas, roxas
tropicais
sindicais.
Eu ouço as vozes
eu veio as cores
eu sinto os passos
desse Brasil que vem aí.


sobre Gilberto AFreyre:
Biblioteca virtual Gilberto Freyre
pinturas de:

* 1 - Gilberto Freyre
* 2 - Manoel Arquilásio Ferreira Diniz
* 3 - Jean- Baptiste Debret




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