Em 1910, dois mil marinheiros se rebelaram e tomaram quatro navios de
guerra na Baía de Guanabara.
O principal motivo da revolta eram os castigos físicos na Marinha.
Vamos voltar 100 anos no calendário da nossa história para contar um dos momentos mais dramáticos da recém-nascida República do Brasil:
Vamos voltar 100 anos no calendário da nossa história para contar um dos momentos mais dramáticos da recém-nascida República do Brasil:
a Revolta da Chibata. Uma
ferida ainda não cicatrizada que atravessou o século e até hoje provoca
polêmica.
Em 22 de novembro de 1910, uma semana após a posse do presidente
Hermes da Fonseca, dois mil marinheiros se rebelaram e tomaram quatro navios de
guerra na Baía de Guanabara.
Durante seis dias, apontaram 80
canhões e ameaçaram bombardear a cidade, que, na época, contava com 870 mil
habitantes.
Tiros chegaram a ser disparados, matando duas crianças.
Quatro
oficiais morreram no encouraçado Minas Gerais.
O motim tinha como um dos comandantes e principal porta-voz um marinheiro negro semialfabetizado, João Cândido Felisberto, de 30 anos.
O principal motivo da revolta
eram os castigos físicos na Marinha, como chibatadas muito comuns, apesar de já
se terem passado 12 anos da abolição da escravatura no Brasil.
Saiba quem era João Cândido e por que a Marinha não o reconhece como
um mito, no que ele acabou se transformando.
Ficou conhecido como o 'almirante
negro', com estátua na Praça XV, nome de um petroleiro, tema livros e
inspiração de um samba muito popular de João Bosco e Aldir Blanc: "O
Mestre-Sala dos Mares
parte 1/3
parte 2/3
parte 3/3
HERÓI INJUSTIÇADO: JOÃO CÂNDIDO – “O
ALMIRANTE NEGRO”
HERÓI INJUSTIÇADO
A família de João Cândido, líder da
Revolta da Chibata, quer os mesmos direitos que os perseguidos pela ditadura
militar
Francisco Alves Filho
Nos livros de história do Brasil, o
marinheiro João Cândido aparece como o herói da Revolta da Chibata.
Corajoso, ele liderou em 1910 o motim no qual
dois mil marinheiros negros obrigaram a Marinha a extinguir punições desumanas
contra os soldados, como ofensas, comida estragada e chicotadas.
Os revoltosos conseguiram seu objetivo, mas
foram expulsos dos quadros militares ou presos e mortos.
Só recentemente João Cândido saiu da
condição de personagem esquecido da historiografia oficial para o papel de
protagonista.
Em 2008, uma lei finalmente concedeu
anistia póstuma a ele e a outros marinheiros.
A reparação, porém, foi incompleta. No ano do
centenário da Revolta da Chibata, João Cândido e os outros revoltosos continuam
sem as devidas promoções e seus familiares sem receber indenização – como
aconteceu com os que resistiram à ditadura militar, por exemplo.
Os prejuízos com a expulsão da Marinha não
foram compensados. “Sinto como se meu pai ainda fosse um renegado e não um
herói”, diz Adalberto Cândido, o Candinho, 71 anos, filho de João Cândido.
As comemorações pelos 100 anos da Revolta da
Chibata não o animam. “Homenagens são bonitas, mas não enchem barriga”,
desabafa Candinho.
Para negar indenização aos
anistiados, há dois anos, o governo alegou que, se todos os descendentes
recebessem, haveria um rombo no orçamento.
O tempo derrubou o álibi: apenas dois
grupos de parentes pediram anistia.
A verdade é que, por trás do argumento, estava
também a resistência da Marinha. Agora, a família de João Cândido torna a
reivindicar seus direitos.
Por causa da exclusão da Marinha, ele não pôde
mais conseguir emprego formal. Mudou-se para São João de Meriti, o mais pobre
dos municípios da Baixada Fluminense, onde parte de sua família vive até hoje.
Por décadas, sustentou a mulher e os sete
filhos com o que ganhava como pescador.
Uma imagem nada condizente com o
personagem épico que o jornal “O Paiz” descreveu como “o árbitro de uma Nação
de 20 milhões de almas”.
O filho recorda-se das dificuldades:
“Usávamos tamancos em vez de sapatos, vestíamos roupas velhas, não tínhamos
eletricidade”, relata. João Cândido morreu na miséria em 1969, em Meriti.
A Lei nº 11.756/2008, de autoria da senadora Marina
Silva (PV), previa a anistia com indenização, que acabou vetada no texto
assinado pelo presidente Lula.
Na época, os
familiares de João Cândido aceitaram a argumentação de que o custo para os
cofres públicos seria muito alto.
Até agora, no entanto, apenas duas solicitações
foram feitas. “Muitos já morreram e outros nem sabem que seus ascendentes
participaram da revolta”, explica o historiador Marco Morel.
Ele é neto de
Edmar Morel, autor do livro “Revolta da Chibata”, primeira obra sobre o tema,
relançada recentemente.
“Mesmo com esse risco, o governo poderia
estabelecer um teto”, diz o historiador.
“Se aqueles que lutaram contra a
ditadura de 64 e seus parentes, muitos de classe média alta, receberam
reparações em dinheiro,
por que não os familiares dos marujos da Revolta da Chibata, quase todos
pobres?” questiona Morel.
Procurado por ISTOÉ, o ministro da
Igualdade Racial, Edson Santos, disse que sua pasta apoiou a anistia. “A
reivindicação por parte da família é um direito democrático”, admite o
ministro.
“O compromisso do governo é estabelecer formas
de reparação que façam justiça à luta de João Cândido.” Santos não diz, no
entanto, se tomará alguma providência prática em favor da indenização.
Um dos
principais responsáveis pela popularização de João Cândido foi o compositor
Aldir Blanc, autor da letra do samba “O Mestre-Sala dos Mares”, em parceria com
João Bosco.
Lançada na década de 70, em plena
ditadura, a música contava a história da Revolta da Chibata e por isso Aldir
foi convocado ao Departamento de Censura.
“Tive que mudar o título, que
originalmente era ‘O Almirante Negro’, para burlar o censor”, recorda-se.
Tratamento desumano
A Revolta da Chibata se desenrolou
entre 22 e 27 de novembro de 1910, na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro,
então capital federal.
Revoltados com as agressões sofridas por parte
dos oficiais e com a comida estragada servida nos navios, marinheiros do Encouraçado
Minas Gerais se amotinaram.
Tomaram o controle da embarcação e ameaçaram
acionar os canhões contra a cidade se os maus-tratos não fossem cancelados –
objetivo que foi alcançado.
O presidente da época, Marechal Hermes da
Fonseca, aceitou anistiar os revoltosos, mas voltou atrás. Muitos foram
expulsos da Marinha, alguns presos e outros acabaram mortos.
A Marinha tornou público seu
ressentimento contra João Cândido em 2008, quando o presidente Luiz Inácio Lula
da Silva inaugurou uma estátua em homenagem a ele, na Praça XV. Na ocasião,
oficiais reclamaram e só se acalmaram quando conseguiram a garantia de que o
monumento não ficaria de frente para a Escola Naval, situada ali perto.
A estátua está voltada para o mar. Diante de
tal rejeição, o filho do Almirante Negro se mostra cansado de brigar.
“Se agora, no centenário da Revolta, não
liberarem a indenização e a promoção dele, eu desisto de brigar”, diz Candinho.
( ISTO É INDEPENDENTE )
Grandes
Brasileiros ( opinião e notícia )
João Cândido
4/05/2006
Nossa tentativa de resgatar os heróis
brasileiros em uma série de textos publicada semanalmente revelou um fato
interessante: heroísmo é um conceito extremamente pessoal.
Foram diversas cartas de leitores
elogiando e criticando cada um destes personagens.
Sendo assim decidimos mudar o nome da série de
reportagens de Heróis brasileiros para Grandes brasileiros.
Desta forma, continuaremos a mostrar feitos de
pessoas que contribuíram para nossa história.
João Cândido: grande brasileiro cantado por Elis
Regina
Os grandes brasileiros podem ser
figuras pouco comentadas nas salas de aula, esquecidas dos livros e da memória
das pessoas.
Mas alguns deles aparecem na música
popular, mesmo que de forma sutil.
É o caso de João Cândido Felisberto, militar
brasileiro que liderou a Revolta da Chibata no ano de 1910.
E a música, de autoria de Aldir Blanc
e João Bosco, se chama O mestre-sala dos mares – o nome originalmente seria
Almirante Negro, porém precisou ser alterado porque a censura julgou que
ofenderia as Forças Armadas. Interpretada por Elis Regina, a letra diz:
Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo feiticeiro
A quem a história não esqueceu.
Conhecido como o navegante negro
tinha a dignidade de um mestre-sala.
A Revolta em que João Cândido
teve destaque é um episódio bastante famoso, o que mostra que os eventos em si
são lembrados com freqüência.
Falta mesmo é dar ênfase a quem fez esses
episódios e fazer esses nomes entrarem para a história, até, no caso de João
Cândido, para fazer jus à letra da composição.
O herói em questão nasceu na Província do Rio
Grande do Sul em 1880, filho de escravos de uma fazenda, e ingressou na Escola
de Aprendizes-Marinheiros do Rio Grande, da Marinha, aos 13 anos.
Em novembro de 1910, quando liderou a
chamada Revolta da Chibata, seu objetivo era pleitear a abolição dos castigos
corporais na Marinha de Guerra do Brasil.
Em outros países essa forma de repreensão já
havia sido abolida: a Espanha extinguiu os castigos físicos em 1823, a França
em 1860, os EUA em 1862, a Alemanha em 1872 e a Inglaterra em 1881.
A Revolta da Chibata teve vitória ao conseguir que o governo federal selasse o compromisso de acabar com o emprego da chibata – o mesmo que chicote, instrumento utilizado nos castigos – e se comprometesse também a conceder anistia aos revoltosos.
Apesar disso João Cândido – designado
Almirante Negro pela imprensa nessa época – e os outros envolvidos na
manifestação foram presos.
Pouco tempo depois, um novo levante entre os
marinheiros, ocorrido no quartel da Ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, foi
reprimido pelas autoridades.
João Cândido se declarou contra a
manifestação, mas assim mesmo foi expulso da Marinha, sob a acusação de ter
favorecido os rebeldes. Seria absolvido apenas em 1912. João Cândido morreu aos
89 anos, no Rio de Janeiro.
Fonte;
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